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Lendas do Sul
O negrinho do pastoreio
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O estancieiro mandou outra vez amarrar o Negrinho pelos pulsos, a um palanque e dar-lhe, dar-lhe
uma surra de relho... dar-lhe até ele não mais chorar nem bulir, com as carnes recortadas, o
sangue vivo escorrendo do corpo… O Negrinho chamou pela Virgem sua madrinha e Senhora
Nossa, deu uni suspiro triste, que chorou no ar como uma música, e pareceu que morreu...
E como já era noite e para não gastar a enxada em fazer uma cova, o estancieiro mandou atirar o
corpo do Negrinho na panela de um formigueiro, que era para as formigas devorarem-lhe a carne e
o sangue e os ossos... E assanhou bem as formigas, e quando elas, raivosas, cobriam todo o
corpo do Negrinho e começaram a trincá-la é que então ele se foi embora, sem olhar para trás.
Nessa noite o estancieiro sonhou que ele era ele mesmo, mil vezes e que tinha mil filhos e mil
negrinhos, mil cavalos baios e mil vezes mil onças de ouro… e que tudo isto cabia folgado dentro
de um formigueiro pequeno...
Caiu a serenada silenciosa e molhou os pastos, as asas dos pássaros e a casca das frutas.
Passou a noite de Deus e veio a manhã e o sol encoberto. E três dias houve cerração forte, e três
noites o estancieiro teve o mesmo sonho.
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