Lendas do Sul
O negrinho do pastoreio
* * * *
O menino maleva foi lá e veio dizer ao pai que os cavalos não estavam. O estancieiro mandou
outra vez amarrar o Negrinho pelos pulsos a um palanque e dar-lhe, dar-lhe uma surra de relho.
E quando era já noite fechada ordenou-lhe que fosse campear o perdido. Rengueando, chorando e
gemendo, o Negrinho pensou na sua madrinha Nossa Senhora e foi ao oratório da casa, tomou o
coto de vela acesa em frente da imagem e saiu para o campo.
Por coxilhas e canhadas, na beira dos lagoões, nos paradeiros e nas restingas, por onde o
Negrinho ia passando, a vela benta ia pingando cera no chão; e de cada pingo nascia uma nova
luz, e já eram tantas que clareavam tudo. O gado ficou deitado, os touros não escarvaram a terra e
as manadas xucras não dispararam...
Quando os galos estavam cantando, como na véspera, os cavalos relincharam todos juntos. O
Negrinho montou no baio e tocou por diante a tropilha, até a coxilha que o seu senhor lhe marcara.
E assim o Negrinho achou o pastoreio. E se riu...
Gemendo, gemendo, o Negrinho deitou-se encostado ao cupim e no mesmo instante apagaram-se
as luzes todas; e sonhando com a Virgem, sua madrinha, o Negrinho dormiu. E não apareceram
nem as corujas agoureiras nem os guaraxains ladrões; porém pior do que os bichos maus, ao
clarear o dia veio o menino, filho do estancieiro e enxotou os cavalos, que se dispersaram,
disparando campo fora, retouçando e desguaritando-se nas canhadas.
O tropel acordou o Negrinho e o menino maleva foi dizer ao seu pai que os cavalos não estavam lá...
E assim o Negrinho perdeu o pastoreio. E chorou...
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