Cancioneiro guasca
Dedicado aos serritanos de Canguçu

- 1820 -

Amigos, irmãos de fado,
Nossos pagos estão perdidos;
Já não são admitidos
           Os honrados

Ilustríssimos senhores
Lá dos pagos do Cerrito:
De arrenegado e aflito,
           Vou falar.

Já não posso suportar
Esse infame proceder;
Por isso vou dizer
           O que são:

Tolos sem comparação,
São todos lá desses pagos
Que não merecem afagos
           De ninguém.

Vergonha nenhuma têm,
São de lares namoradores,
Que por causa dos amores
           Vivem brigando.

De contínuo rezingando
Uns com os outros só se vê;
Vejam a causa por que
           Fazem isto.

Várias vezes tenho visto
O motivo dos enfados;
Querem todos ser amados
           De por força!

Um diz: - Veja aquela moça
- Sendo bela e delicada,
- Foi-se fazer desgraçada
           - Por seu gosto;

- Pois é de importuno rosto
- O moço a quem ela quer;
- Bem dizes: sempre é mulher,
           - Amigo!

- Sendo eu tão belo figo,
- Mil vezes melhor qu'ele,
- Foi-se agradar daquele
           - Traste!...

Diz outro: - Tarde andaste,
- Devias ter-te adiantado
- Com mais sinais de agrado
           - À tal.

Responde: - Guerra fatal
- Tenho feito àquela ingrata;
- Mas ela de resto trata
           - O meu amor.

- Tome um conselho, senhor,
Que lhe dou, sou amigo.
Não queira ser inimigo
           Da paz.

Deixe lá o pobre rapaz
Gozar da sorte o prazer,
Para que você há de ser
           Assim?

- Adoto o conselho enfim,
- Que o meu amigo me dá;
- Ela se arrependerá
           - De desprezar-me.

- Hei de ver outra e casar-me;
- Mostrar-lhe quanto mereço
- Pois tenho quem faça apreço
           Em minha pessoa.

É uma razão mui boa
E melhor você não pensa.
A seca vai sendo extensa;
           Adeus!

Vá cuidar dos passos seus
Que eu dos meus vou tratar,
Para não dar que falar
           Ao mundo... -

É de juízo profundo
Um dos tais namoradinhos,
Que ficou fazendo pratinhos
           De conselheiro.

Faz-me falta o dinheiro
P'ra minha desdita seguir;
Mas, com quem discutir
           Eu sempre acho.

Logo sem mais demora,
Vejo um que era dos tais,
Tolo inda talvez mais
           Que o primeiro.

- Deus guarde, cavalheiro!
- Estimo de o encontrar,
- Para poder conversar
           - A gosto.

Veja como trago este rosto,
- De mil raivas incendiado!...
Que comigo tem se passado
- Casos tristes.

Tu, que no mundo existes
- Alguns anos mais do que eu,
- Repara o que sucedeu
           - No distrito.

- Eu, de agoniado e aflito,
- Até falei na hora de casar.
- .....................................
           .......................

- Agora vou nomear
Os que seguem esta carreira;
José Barbosa Siqueira
           É o primeiro.

E também seu companheiro,
Que é de nome Constantino,
Que às vezes fica interino
           Em seu lugar...

Os Caetanos vão gastar
Os seus reais por ter estrada;
E o Borges é camarada
           Da súcia.

Não são de menos astúcia
O Ermilindro e o Pantaleão;
Também anda no cambão
           Hilário.

E outros de juízo mais vário
Como três, que me iam ficando:
O Maximiano, o Hildebrando
           E o Inácio da venda.

Fica acabada a contenda;
Em que isto dá, quero ver,
E também seu proceder
           Tolo.

Meus senhores, me desculpem
A minha pouca extensão:
Que, se eu fosse falador,
Muito mais diria então.

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